Nos últimos dias muitos investidores ficaram desorientados sobre o comportamento das LFTs – também conhecidas como Tesouro Selic – uma vez que se depararam com a rentabilidade negativa de seus títulos.
Como o investidor pode perder recursos aplicando no Tesouro Direto já que deveria render a variação diária da Selic, que é sempre positiva? O que está ocorrendo?
Com o aumento das preocupações fiscais e a piora das condições para o financiamento da dívida pública, os títulos públicos perderam valor no mercado secundário e as LFTs, que acompanham a variação da taxa Selic, estavam sendo negociadas com deságio, ou seja, abaixo de seu valor de face.
Para alguns gestores, caso a situação não se reverta logo, há possibilidade de os investidores começarem a resgatar seus recursos o que complicaria ainda mais o cenário, dado que levaria o gestor a se desfazer dos papeis desvalorizados no mercado provocando uma espiral negativa, já que os fundos podem precisar vendê-los a qualquer preço.
A renda é fixa, mas oscila
Muitos ainda não sabem que até mesmo a renda fixa pode enfrentar períodos de instabilidade. Entretanto, o prejuízo só se concretiza na venda do papel caso opte por se desfazer do ativo antes do prazo. Isto quer dizer que, caso o investidor leve o papel até o vencimento, seu resultado é conforme o acordado.
Diariamente as instituições financeiras compram e vendem títulos entre si através de um mercado secundário, cujas taxas praticadas são ditadas pela oferta e demanda. Caso haja maior demanda por um determinado título, que tem uma determinada data de vencimento, a tendência é a de que o preço desse título aumente e por sua vez, a taxa diminua. A relação inversa também é verdadeira.
Neste mês, o Tesouro Nacional começou a elevar a oferta de títulos prefixados e, mesmo com os prêmios atrativos, não vendeu todo o montante. As taxas do prefixado de longo prazo elevaram-se, contaminando inclusive o Tesouro Selic. Com o quadro fiscal bastante desafiador para a gestão da dívida pública foi uma demonstração de que o mercado não está disposto a receber rentabilidade próxima a 2% a.a. para correr o risco fiscal embutido.
Tesouro Selic não rende a Selic
Primeiramente vale relembrar que quando a taxa do título cai, o preço do mesmo sobe, valorizando a aplicação. O contrário também é verdadeiro.
Além disso a rentabilidade ao se investir num Tesouro Selic não vai ser exatamente igual a taxa Selic. O resultado deste título é dado pela variação acumulada da chamada “Taxa Selic Diária” (“Selic over”) registrada entre a data de compra e a data de vencimento do ativo acrescida, se houver, de ágio ou deságio. Entender o funcionamento dessa taxa adicional faz toda a diferença.
No site do Tesouro Direto o investidor pode notar que existe uma coluna chamada “Rentabilidade Anual” e que muda diariamente. Imagine que o Tesouro no dia prometa pagar SELIC + 0,0827% para vencimento em 2025. Essa remuneração só vale caso o investidor fique até a maturação do título e, caso contrário, estará sujeito às mudanças diárias. Caso venda antecipadamente deverá aceitar outra taxa. Inclusive o Tesouro Direto já oferece ao investidor o extrato com as marcações a mercado, isto é, caso venda antecipadamente e não o quanto receberá caso aguarde até o vencimento.
Quando o Tesouro Selic pagava taxas elevadas ao ano, essa pequena taxa adicional produzia um efeito pequeno e não tão perceptível porém, com a Selic no menor patamar histórico, o impacto é maior. Sempre que o Tesouro Nacional decide aumentar essa taxa ou o deságio no título, os investidores podem perceber uma queda no preço de seus títulos. Por isso, vale ressaltar que essa pequena taxa adicional que aparece nas tabelas do Tesouro Direto pode interferir no preço de venda antecipada do ativo. A saída será negativa caso a taxa suba e positiva se a taxa caia. Isso quer dizer que a queda da taxa adicional melhora a remuneração do título no curto prazo e ela tenderá a cair naturalmente até 0% quando estiver próximo ao seu vencimento.
Mudanças na taxa em momentos de crise
Em 2020 ocorreram diversas mudanças nessa taxa adicional de remuneração do Tesouro Selic e a mesma tende a se alterar quando passamos por uma crise. A taxa chegou a ser de 0,03% e, recentemente, elevou-se para 0,08% causando um impacto mais evidente no preço de venda antecipada ou marcação à mercado do título.
O prêmio que funciona como um deságio (aumento da taxa adicional) no valor desses títulos atrelados à taxa Selic, mostra um quadro diferente de outras crises. O Tesouro Selic é visto como um “seguro” aos investidores e o Tesouro Nacional e acabava aumentando as emissões desse papel. Ao olharmos para as crises anteriores do Brasil, a Selic subia e como consequência, o interesse dos investidores pelo ativo também aumentava.
Em suma o que vem ocorrendo desde a semana passada reflete as forças de oferta e demanda. O aumento desses prêmios pode indicar que no período houve maior fluxo vendedor do que comprador do título. Para alguns esse ajuste pode durar mais alguns dias e o risco maior está na possibilidade de resgates em fundos como os de renda fixa levando à espiral negativa comentada anteriormente e assim gerar novas quedas de rentabilidade.
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